Chegam-me do fundo do tempo as vozes dos que se encontram ao passar na rua. Uma rua estreita, de penedos lisos e escorregadios das águas que das janelas se entornam de bacias sem culpas... Mulheres carregadas com cestas à cabeça e homens de enxada ao ombro e sacos de serapilheira p'la cabeça, a protegerem-se da morrinha com que o dia acordou. A falarem de coisas ocasionais como as dores que sentem no corpo, de sucedidos novos ou antigos, ou até, de feitos ainda por fazer. São pedaços de ontem. Pequenos nadas entrecortados de silêncios macios de musgo. De vez em quando, uma ou outra gargalhada entre uma piada e um convite p'rá matança do bicho na escuridão da adega... E eu, saltitando no muro encostado ao caminho ao fundo do quintal, entretida com as pequenas descobertas da vida que brotavam entre as pedras, sem fazer grande caso das conversas dos adultos. Mas as vozes, inaudíveis, a ecoarem num murmúrio, neste retalho de escrita que se perde no tempo...
Cleo
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