quinta-feira, 7 de março de 2019

Tenho em mim um desassossego


Tenho em mim um desassossego de alma, uma alma aflita... diz-me a cara-metade. Uma espécie de chaga que me atormenta o pensamento e me tolda a mente inquinando-me o espírito faminto de paz. É como um rio que, chicoteado pela tempestade corre desgovernado, galgando margens e levando consigo tudo o que lhe aparece pela frente. E o pior é que lhe sinto a fúria e me deixo ir na apatia da frágil canoa sem remos e à mercê da corrente... Pode ser que o sol volte amanhã, a fazer lembrar as primaveras de ontem, onde jardins encantados se cobriam de borboletas esvoaçantes e multicolores que poisavam aqui e ali e também nos sorrisos das pequenas flores que cobriam o chão da minha inocência e me resguardavam do cinzento carregado das nuvens dos invernos que ainda estariam por vir. Ninguém me esclareceu do perigo nem me advertiu para o facto de um dia me achar tão longe a desejar voltar ao sítio onde deixei as primaveras que julgava serem eternas. O que me vale são os retratos do álbum da memória que me não deixam esquecer que a felicidade existe e que podemos ser felizes à distância de um piscar de olhos, se nos contentarmos com isso. São tão simples as coisas pequenas, como simples são os gestos que as tornam tão importantes quanto a nossa capacidade de lhes chegar.

Cleo

2 comentários:

  1. Memórias

    Ressoam na calçada deserta
    Estridente, o som dos seus passos
    Avança, no nó que a saudade aperta
    Passam memórias nos olhos lassos.

    Pulsava fremente de vida
    Quando da aldeia se apartou
    Na memória, tanta gente querida
    Que já não viu quando lá voltou!

    Das casas, restam os muros
    Inexoráveis, guardas do templo
    Ali ficaram quedos e mudos
    Testemunhas de outro tempo!

    Chegou enfim à velha casa
    Onde a mãe de sua mãe nasceu
    De silvas a casa rasa…
    E a porta apodreceu!

    Cansada…
    Refresca as memórias na fonte
    De olhos alagados, saudoso pranto
    Perdida de si, sem saber onde!
    João António Silva
    05/03/2019

    ResponderEliminar
  2. Meu caro amigo, maravilhoso presente poético o seu, que aqui me deixa. Não poderia ser mais à medida, visto que me assenta que nem uma luva!...

    Muito e muito obrigada!

    ResponderEliminar