quinta-feira, 16 de março de 2023


É como num sonho, só que estas são imagens antigas a passarem-me na mente como se de um filme se tratasse, sem pertencerem a nenhum sonho. Aconteceram mesmo. São reais, mas bastante antigas visto serem das primeiras de que me lembro.
Seria por certo inverno, porque a claridade que a porta meia aberta deixava entrar, a não ser quase nenhuma. Provavelmente o céu carregado de nuvens cinzentas, escuras. Ou talvez até estivesse a chover mesmo. Disso não me recordo.
Lá dentro, o único conforto que existia era uma salamandra a engolir cavacas e para o pé da qual se chegavam os que vinham da rua e ali paravam a dizer qualquer coisa. Um pretexto para aquecer as mãos e os pés, antes de irem todos matar o bicho que estava escondido dentro das pipas na adega.
Nesta memória, naquele dia, uma panela cheia de grude castanho a derreter devagar. Uma mexidelazita de vez em quando com uma ripa curta e, daí a um pedaço, o meu pai com um pincelito a molhar no grude e a esfregar as ranhuras das tábuas onde antes a lâmina afiada do formão, o raspador e a lixa no restante. De seguida as outras com pequenas saliências nos mesmos sítios a encaixarem-se na perfeição, como se fossem peças de um lego qualquer.
Ele a aplicar-lhes uns grampos de rosca e a encostá-las ao alto a um canto para que secassem bem antes de lhes dar o destino final. Talvez uma cabeceira de uma cama ou umas gavetas de alguma cómoda...


 

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