terça-feira, 5 de março de 2019

Era de madeira



Era de madeira a minha primeira mala, que levei para a escola no meu primeiro dia de aulas aos seis anos de idade.Não seria de admirar se o meu pai não fosse artista em transformar tábuas naquilo que bem quisesse, mas uma mala de madeira... E se calhar, não seria assim tão descabido visto que há pouco tempo lhe tinha sido feita uma encomenda (da parte do barbeiro, o "rusga" da Benfeita) uma mala do mesmo género, onde este arrumava e transportava as traquitanas que lhe eram precisas aquando das deslocações que fazia de terra em terra, acudindo e tratando das guedelhas aos fregueses.. Lá no Pai das Donas, era mesmo ali, na oficina do meu pai que se improvisava a barbearia. Cabelos que íam tombando não resistindo ao frenético tic-tic da tesoura, misturando-se com as aparas e a serradura que cobriam o chão. De maneira que, de mala na mão e sorriso de satisfação plantado no rosto, caminhava de alma cheia na minha ingenuidade infantil, tanta, que nem me apercebia dos olhares e dos cochichos dos outros, que, logo no primeiro dia se não pouparam a fazer pouco de quem surgia do nevoeiro da inocência, levando orgulhosamente na mão, toda a pureza da ingenuidade .A partir daquele dia, a par das letras e dos números, fui começando a aprender também, tudo o resto de que é composto o mundo e as pessoas e que até ali nunca me tinha dado conta.

Cleo

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