quinta-feira, 7 de março de 2019




Trazia nas mãos enrugadas que às vezes escondia nos bolsos do avental negro, a aspereza dos calos de uma vida inteira. Não era o caso, em virtude da lenha para a fogueira onde a panela de ferro já a esperava. Pela cabeça, a capucha de lã escura em cuja aba se resguardava do vento cortante de janeiros antigos. Nos pés, as tamancas de pau íam mastigando a cada passo o gêlo que emergira do chão à força. Nos olhos de mar que nunca viu, saltavam-lhe alegrias difíceis de compreender visto que do mundo só conhecia aquela terra que a viu nascer e toda a dureza que sempre acatou sem se questionar, sem um reclamo que se fizesse ouvir. Fiquei ali a vê-la desaparecer no meio da neblina, como um fantasma que tal como apareceu, se diluiu sem deixar rasto. Pouco depois anoiteceu e o silêncio engoliu a aldeia por completo. Só o cheiro a lume vindo dos telhados e um clarão ou outro por dentro dos vidros de janelas baças.

Cleo

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