quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Cresci entre casas de pedra


Cresci entre casas de pedra com varandas de madeira e tapetes de quintãs, para os despejos das águas sujas, onde se limpavam os pés antes de subir as escaleiras altas e entrar em casa. E estas a desembocarem num corredorzito de frontais e sobrado de tábuas corridas, já bastante carunchadas, a denunciarem a passagem do tempo. Uma vassourazita de giestas a varrer o cachiço do braçado dos gravetos para o lume, porque dali a nada seriam horas de fazer o caldo. Este era um tempo em que se contavam muitas estórias, visto nestas casas, quem lá morava, não me lembro de lhes ouvir um lamento que fosse pela falta de um rádio a pilhas... Não sabiam como era nem se interessavam por tal(já outras mais novas, não perdiam um folhetim do "simplesmente Maria", nem que para isso tivessem de levar o aparelho e o pendurar num ramo de oliveira, enquanto se cavava a terra). Normalmente eram viúvas vestidas de negro, com tamancas nos pés, xaile pelas costas e lenço na cabeça atado num laço ao queixo. Contavam-me estórias do tempo dos lobos na serra e dos cordeiros que lhes levavam nos dentes, sem que pudessem fazer fosse o que fosse, por terem pouca idade e serem quase da mesma altura das ovelhas que as mandavam guardar.

 Cleo

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