domingo, 2 de agosto de 2020
Não havia ninguém na aldeia
Não havia ninguém na aldeia, pelo menos que eu conhecesse, que limpasse tão bem os cômbaros, os caminhos e as levadas, de ervas e silvas como o Ti Armando. Sempre de roçadoira bem afiada na mão, "não havia pai para ele" nessa matéria. Viesse quem viesse, mas a perfeição era a sua especialidade.
Costumava encontrá-lo muitas vezes nos lugares por onde costumava passar, também eu a caminho ou à vinda de alguma tarefa do campo a que estava obrigada e lá andava ele entretido, a ceifar rentinho ao chão ou aos muros das calhadas. Ao outro dia, se ali voltasse a passar por acaso, até me dava gosto ver tudo aquilo assim, limpinho!
Mas para além do Ti Armando, toda a gente que tinha gado nos currais e sítios a precisarem de ser limpos, se não descuidavam de o fazer nas alturas certas. Arranjavam refeição para o gado e limpavam o que era seu ao mesmo tempo. E quem diz isso, diz matos nos pinhais em redor da aldeia e até fetos e caruma. Tudo lambido que era um mimo. Já hoje...
E não é que não houvesse fogos. Também os havia que bem me lembro de os espreitarmos de noite à janela. Nós e os vizinhos, a falarmos uns com os outros, a adivinharmos onde é que andaria o fogo, se perto ou longe, assustados pelas fagulhas a cairem do céu... E o clarão lá por detrás dos montes, até altas horas da madrugada. Não fosse o lume aparecer-nos à porta de repente e a apanhar-nos desprevenidos como da outra vez em que o sino tocou a rebate a meio da noite e todos a acordarmos alvoraçados.
Mas nunca nada como agora! Que em menos de nada, lá vai tudo...
Cleo
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